sábado, 28 de junho de 2025

Lar é onde o coração está - capítulo 89

  

— Nossa, estou exausto. — declarou Joaquim enquanto voltavam para casa e complementou com “ainda bem que amanhã é domingo”, ao que Francisco concordou com um murmúrio positivo.



— Mas foi legal sair com o pessoal. — Joaquim observou enquanto se espreguiçava no banco do passageiro, fazendo com que a camiseta que usava subisse alguns centímetros, exibindo seu umbigo e tal gesto não passou despercebido por Francisco, que deu uma olhada rápida naquela direção.

— Só achei que o Diego tava meio mal-humorado, não tava? — perguntou Francisco enquanto paravam em um sinal. Mesmo sendo três da manhã, havia câmeras rodoviárias nos postes e ele não queria pegar uma multa.

— Então, pelo que ele me contou, aconteceu uma coisa chata lá na imobiliária onde ele trabalha e daí, ele acabou descontando no Marcelo. Espero que eles tenham se resolvido. — o loiro murmurou chateado.

— Eles vão se acertar, todo casal briga de vez em quando. A gente também teve nossas diferenças. — ao que ouviu Joaquim dizer “E como temos”. Para o loiro estava difícil ficar acordado, tinha levantado cedo para trabalhar naquele sábado e não costumava dormir tão tarde...

Acabou cochilando antes de chegarem em casa.

— Quim? Vem, vamos pra casa. Coloca o braço aqui em volta do meu pescoço, isso! — Francisco enlaçou o namorado pela cintura e o ajudou a caminhar até o elevador que dava para os apartamentos e com certa dificuldade Francisco pescou as chaves do apartamento no bolso e entrou, ainda amparando Joaquim que permanecia semi-acordado.

  — Eu posso ir pro quarto sozinho... Não se preocupa. — o loiro murmurou cambaleando sonolento, sendo auxiliado pelo namorado que riu baixinho e o guiou até o quarto, onde o ajudou a se trocar e colocou-o na cama.

Embrulhado nas cobertas, Joaquim soltou um suspiro satisfeito quando sentiu a mão morna de Francisco fazer um afago no seu rosto. O outro rapaz então se retirou para a pequena sala de estar do apartamento, pois não estava com sono.

Ele se sentia feliz de ter alguém de quem cuidar.

***

— Ainda não acredito no que aquele cara fez com a Darcy lá no barzinho. Digo, eu não sou idiota, eu sei que tem gente LGBTfóbica em toda a parte, mas caramba, num barzinho lá da Augusta! De todos os lugares do mundo aquele era o ultimo em que eu... Enfim, você entendeu, né? — Mayara desabafada sua frustração com Letícia enquanto elas voltavam para o apartamento.

— Com certeza! O cara foi um escroto com ela e depois se voltou contra a gente e as outras moças do bar também! Depois que o pessoal do bar expulsou ele, eu ouvi o gerente falar que aquele tipo estava começando a proliferar por lá. Também, com quem está no poder... Já era de se esperar. É como se tivessem aberto a tampa do esgoto e liberado todo tipo de atrocidade... — Letícia complementou desgostosa, sentindo uma saliva amarga se juntar em sua boca. Ela não costumava debater política, mas era meio difícil não fazer isso quando o atual idiota no cargo de presidência queria toda a sua comunidade morta.

— Né? Eu já estou acostumada com algumas reações homofóbicas “mal” disfarçadas, que nem aquele dia que a gente estava lá em frente de casa e aquelas duas fofoqueiras passaram nos encarando. Eu sou filha de um casal de lésbicas quando a adoção homoafetiva nem existia, então é obvio que sempre tive de lidar com esse tipo de violência, mas agora ta fora do controle. O Diego contou que ele e o Marcelo foram constrangidos outro dia no cinema, porque deram um selinho. — Letícia perguntou se eles haviam feito boletim de ocorrência e ouviu a namorada dizer que sim, mas que não acreditava que serviria de muita coisa.

— Esse tipo de coisa se arrasta as vezes até por anos antes que alguém seja processado... Mas claro que eu disse ao Diego que ele fez bem de denunciar, mesmo que demore, a gente precisa mostrar que não somos “de matar com a unha”, como diz minha mãe Joana. Mas é frustrante. — o plano quando chegassem ao apartamento de Letícia era tomarem um banho morno e irem dormir. Elas estavam de acordo que não tinham animo para fazer nada mais físico.

E a sugestão ter partido de Letícia causou em Mayara uma sensação de confiança e acolhimento, especialmente por não ter sido ela que teve de manifestar o desejo de apenas dormirem abraçada aquela noite.  

***

Enquanto voltavam para casa, Diego permanecia quieto, pensando em como se desculpar pelo seu comportamento de antes. Ele até ensaiou iniciar uma frase, mas acabou desistindo segundos antes.

Eles ficaram em silencio até chegarem em casa. A tensão era tanta que poderia ser cortada ao meio com uma faca.

— Você vem pra cama? — Diego Ouviu Marcelo perguntar e desconversou arrumando uma desculpa qualquer para continuar na cozinha. Estava envergonhado do próprio comportamento, mas não tinha coragem de se desculpar.

Começou a se ocupar lavando algumas poucas peças de louça que estavam na pia, ao mesmo tempo em que remoia toda a situação daquela noite, murmurando um “como eu sou idiota” baixinho de tempo em tempo.

Quando colocou o ultimo copo no escorredor, Diego se segurou na pia, os braços afastados e as mãos espalmadas enquanto soltava um longo e cansado suspiro. E então ele foi surpreendido por Marcelo que o abraçou pela cintura com cuidado enquanto sussurrava.

— Tá melhor? — se surpreendeu ao ouvir Marcelo perguntar tão calmo e controlado e ao mesmo tempo, com a proximidade da voz e o calor do hálito dele contra seu pescoço, Diego sentiu um pequeno arrepio de prazer. Apesar disso, naquele momento, toda a compostura do marido apenas causou mais desconforto, fazendo Diego pensar em como havia sido idiota.

— Pra ser sincero, estou. Desculpa ter sido um idiota com você mais cedo... E aquilo que você falou... Você estava certo, a gente ta criando o Paulo juntos e eu não devia te impedir de participar... Na verdade, aquilo tudo foi só a gota que faltou pro meu copo transbordar. — Diego então mordeu o lábio inferior com força bastante para causar um pouco de dor, aliviado por ainda estar de costas para o marido.

— Mas, o que aconteceu? Foi algo que eu fiz? — Marcelo estava sendo cauteloso ao formular a pergunta, porque não queria entrar em outra discussão sem sentido com o marido.

— Não! Nunca. — em um gesto impulsivo, Diego se virou dentro do abraço, encarando os olhos gentis de Marcelo e sentindo uma batida falhar no peito.  Após soltar outro suspiro longo e exausto, continuou.

— Foi uma coisa que aconteceu na imobiliária há alguns dias... Lembra da enxaqueca que eu tive? Então, foi causada por isso... — e ele contou sobre toda a situação envolvendo o casal de lésbicas, cuja locação de um apartamento estava prestes a ser oficializada, até que a dona do imóvel, uma mulher na faixa dos 50 e poucos, ao descobrir quem seriam as inquilinas, disse sem qualquer rodeio na cara das duas que não iria alugar para “gente como essa ai”.

— E daí ela ainda disse várias outras coisas bem homofóbicas e eu tive de fingir que nada daquilo me afetava! Claro que eu e o Raul repreendemos a mulher, dissemos que ela estava cometendo um crime e tudo o mais, mas não adiantou. E para completar, ela ainda tirou o imóvel da nossa imobiliária. Agora imagina eu, um homem gay, casado com outro homem, vendo esse tipo de reação escrota e não podendo nem responder a altura ou podia perder o emprego! — Marcelo viu o marido suspirar cansado mais uma vez e acabou perguntando o porquê de ele não ter lhe contado sobre aquela situação.

— Não sei, acho que eu não queria te preocupar... — às vezes Diego guardava problemas para si e ficava remoendo tudo por dias, até acabar tendo um mal estar físico.

— Tá tudo bem, já passou. — Diego sentiu o marido abraçá-lo e enquanto escondia o rosto na curva do pescoço dele, esboçou um pequeno sorriso em resposta. Apesar de que para ele não havia “passado”, mas assim como Marcelo, ele também não queria iniciar outra discussão sem sentido.

— Sabe, mudando de assunto, eu fiquei feliz de saber que eles vão casar... — comentou Diego, que após se afastar alguns centímetros do abraço de Marcelo, começou a girava a própria aliança no anelar da mão esquerda de forma distraída.

 — Apesar de eu não ter demonstrado muita... Animação quando eles falaram... Acho que depois vou ligar pro Joaquim e me desculpar por que... — mas o resto da fala foi omitido por um beijo apaixonado que Marcelo lhe deu, o fazendo enlaçar o pescoço dele com os braços, enquanto experimentava a sensação sedutora da língua dele domando a sua.

— Eu acho que o Joaquim não ficou chateado, você precisa tentar se preocupar um pouco menos... — Marcelo deslizou o polegar da mão direita contra os lábios macios de Diego, observando como ele já estava excitado apenas com aquele contato breve.

  ...Que tal a gente ir lá pro quarto e eu...Alivio um pouco da sua tensão? —  viu Diego sorrir com a sugestão e se deixar guiar puxado com gentileza pela não até o quarto, onde Marcelo derrubou o marido com um movimento suave sobre a cama.

Diego se permitiu apreciar as sensações que eram causadas em seu corpo conforme o marido o despia e beijava cada parte recém-exposta de pele, arrancando dele suspiros baixos de satisfação. Fazia algum tempo desde a última vez que eles ficaram íntimos sem se preocuparem que Paulo ouvisse alguma coisa.

Porque era isso o que diziam sobre sexo depois de ter filhos, não é? A freqüência diminuía e a menos que fosse um completo insensível, você começava a se preocupar se algum som chegaria até o quarto da criança e isso, obvio, atrapalhava poder sentir prazer.

— Ei, volta pra mim... — ouviu Marcelo sussurrar perto de seu ouvido, causando um arrepio elétrico no comento em que beijou a curva do seu pescoço com carinho.

— Desculpa, eu só tava pensando... — “No Paulo?” complementou Marcelo ao mesmo tempo em que esboçava um pequeno sorriso e complementava a frase com “Ele está bem, você não precisa se preocupar”.

— É que foi meio... Involuntário. — Diego riu sem jeito enquanto sentia seus sapatos e calças serem removidos e em seguida uma caricia preguiçosa ser feita sobre sua semi-ereção, ainda coberta pela roupa intima. Em seguida observou o marido pegar alguns preservativos e o tubo de lubrificante na gaveta de uma das mesinhas de cabeceira.

— Eu entendo, mas só por hoje, tenta se desligar de tudo isso. Dos problemas, das preocupações e foca só aqui na gente agora, acha que consegue? — Diego soltou um risinho irônico, afinal o outro estava pedindo para alguém com ansiedade crônica para não pensar negativamente no futuro e não se preocupar com todo tipo de situação hipotética catastrófica?

— É, eu acho que posso tentar. — agora estava totalmente despido e observava Marcelo remover as próprias peças, igualando a situação rapidamente, mas quando fez menção de se sentar para dar algum prazer ao parceiro, foi impedido pela mão espalmada do marido em seu tórax, segurando-o com delicadeza.

— Não, hoje você só aprecia. — se apoiando nos cotovelos, Diego concordou com um meneio de cabeça enquanto sentia a língua morna do outro deslizar com suavidade pela extensão de sua rigidez lhe causando arrepios deliciosos.

Aquelas caricias suaves por toda a pele tesa fez Diego encher as mãos com o lençol abaixo de si, enquanto jogava a cabeça para trás e permitia que um ofego sufocado escapasse de seus lábios, enquanto na outra extremidade do contato íntimo, Marcelo observava maravilhado as reações do marido.

E quando sem aviso teve sua rigidez engolfada com delicadeza pelos lábios mornos do marido e ao sentir-se abarcado dentro daquela cavidade morna, Diego exprimiu um suspiro surpreso e deliciado ao mesmo tempo em que levava uma das mãos até o topo da cabeça de Marcelo, fazendo um agrado suave conforme sentia a felação aumentar de ritmo.

Uma das mãos espalmadas de Marcelo deslizou pelo ventre e tórax desnudos de Diego, até alcançar o mamilo direito, o qual começou a arreliar com lentidão enquanto ainda o tomava com a boca. E foi quando Diego sentiu os dedos úmidos de lubrificante do parceiro roçar contra sua entrada, contornando ao redor em uma preparação agonizante para o que viria a seguir. Em resposta, ele fechou os olhos e suspirou extasiado quando sentiu um digito de Marcelo invadi-lo com vagarosidade, ao mesmo tempo em que a felação continuava constante.

— Marcelo... Eu... Hmm... — Diego pediu por entre ofegos excitados, não conseguindo completar a frase. Tinha três dedos do marido dentro de si e ainda estava sendo estimulado pela boca do outro mas ansiava por mais. Precisava sentir o outro por completo.

— Você quer que eu continue? — a pergunta era retórica, afinal, o desejo estava estampado no rosto de Diego, mas Marcelo não conseguiu evitar de proferir a frase e sentiu uma fisgada dolorosa e excitante no próprio baixo-ventre ao ver o parceiro concordar com um meneio breve de cabeça.

O rosto de Diego estava afogueado e podia-se ver pequenas gotículas de suor escorrendo por suas têmporas, assim como a respiração dele se apresentava acelerada e constante e em resposta, Marcelo arreliou o mamilo direito com lentidão arrancando mais um gemido sufocado de prazer, o que o fez sorrir.  

E assim que removeu os dedos do interior do parceiro e o retirou de sua boca, Marcelo se inclinou sobre Diego e o beijou nos lábios com suavidade, fazendo com que o outro provasse do seu próprio gosto, salgado e ácido na saliva dele, conforme suas línguas se enrolavam e torciam lentamente.

Após observar o marido colocar o preservativo no próprio membro, Diego sentiu o peso morno do corpo macio sobre o seu, o contato úmido da pele contra a sua e o toque suave dos lábios tocando nos seus próprios, apenas um suave roçar quase virginal, ao mesmo tempo em que a ponta morna da rigidez dele roçava com suavidade contra sua entrada pulsante.

Sentiu a mão morna acariciando sua coxa ao mesmo tempo em que sentia-se ser preenchido por completo pelo outro e isso lhe causou um novo pequeno ofego de prazer, que em resposta, levou um dos braços até as costas de Marcelo e deslizou as unhas com um pouco mais de força do que o planejado contra aquela pele morna e sedosa, enquanto sentia-se abarcar por completo o marido dentro de si.

Em seguida ele envolveu os quadris do parceiro com as pernas, apoiando os pés na altura dos quadris, enquanto sentia seus corpos se chocarem com suavidade e a cadencia das investidas aumentarem para então esconder o rosto na curva do pescoço de Marcelo, exprimindo alguns gemidos sufocados de puro êxtase.

— Eu te amo, Di. — ouviu o outro sussurrar em seu ouvido enquanto após algum tempo que ele não conseguiu precisar, liberava sua carga contra o preservativo, mas ao tentar responder, tudo o que Diego conseguiu deixar escapar de seus lábios foram gemidos vocálicos dentre os quais exprimiu a palavra “também”. E alguns minutos depois, ele também atingiu o ápice, com a ajuda de uma breve masturbação feita pelo outro.

A mão firme de Marcelo segurando sua nunca enquanto os dedos habilidosos trabalhavam em sua rigidez e o jeito como podia ver os olhos apaixonados dele sobre si causaram um efeito afrodisíaco consistente e ao mesmo tempo em que se deixava esvair entre os dedos do parceiro, Diego afundou a cabeça contra o travesseiro, experimentava aquela sensação de saciedade que apenas uma sessão de amor bem feita era capaz de causar.

Sonolentos, ofegantes e exaustos, os dois permaneceram deitados nus, lado a lado na cama, por um período que não conseguiram delimitar, mas que pareceu ao mesmo tempo longo e curto demais.

— Me promete uma coisa? — Marcelo murmurou, após descartar o preservativo na pequena lata de lixo que ficava ao lado da sua mesinha de cabeceira, limpar o ventre de Diego com uma toalha de forma dedicada e em seguida pegava as cobertas para colocar sobre ambos.

— O que? — Diego perguntou enquanto experimentava o calor morno dos edredons e se aninhava ao lado do parceiro, sendo abraçado com carinho.

— Que você não vai mais guardar seus problemas só pra você... Eu sou parte da sua vida, assim como você é da minha, e eu não quero ver só os momentos bons, eu quero te dar apoio quando algo complicado acontecer. — Diego escondeu o rosto sob as cobertas, sentindo-se envergonhado pelo papel infantil que havia feito antes. Não era que não confiasse em Marcelo, apenas queria ter conseguido resolver seus problemas por conta própria.

— Di? Qual a sua resposta? — um silêncio desconfortável havia caído sobre o quarto e Marcelo se perguntou se havia feito o certo intimando o outro naquele momento. Mas precisava resolver as coisas o mais breve possível.

— Eu prometo! Sei que preciso aprender a controlar um monte de sentimentos e reações e a compartilhar certas situações com você, caramba, você tá sempre me dando apoio e eu ainda consigo estragar tudo! — desabafou Diego enquanto espiava pela borda das cobertas.

— Mas é isso que é fazer parte de um relacionamento. A gente se apóia e divide as situações complicadas. No futuro se acontecer algo parecido de novo, conta pra mim, ta? Eu sempre vou estar aqui pra você. — Diego sentiu um beijo suave ser depositado no topo da sua cabeça e sorriu, respondendo.

— Eu também sempre vou estar aqui por você. — eles até cogitaram de engrenarem em uma segunda rodada, mas o cansaço foi mais forte. Eles estavam mentalmente exaustos.

***

No dia seguinte, Paulo acordou um pouco assustado por não estar no próprio quarto, mas ao se lembrar que estava na casa de Lola e Joana, o menino se acalmou. Ele levantou, trocou de roupa, foi ao banheiro onde fez xixi e escovou os dentes e então desceu para a cozinha.

— Bom dia, rapazinho! Quer comer? — Lola estava em pé perto do fogão. A idosa usava um turbante em volta dos cabelos prateados e uma longa e larga camisola de flanela e Paulo pensou em quanto se sentia bem na presença daquela mulher que dizia que ele podia chamá-la de “vó”.

— Bom dia vó Lola, eu quero sim, o que tem pra comer? — ao que Joana, que  havia acabado de entrar na cozinha emendou “Melhor perguntar o que não tem, quando tem visita aqui em casa a Lola se supera na cozinha, não é mesmo querida?” e em seguida a idosa indígena depositou um beijo suave no rosto da esposa, que em resposta lhe deu um tapa leve com o guardanapo que estavas em seu ombro, ao mesmo tempo em que a mandava se sentar.

— O Paulo não é visita, ele é parte da família! Aqui querido, temos pão de queijo,  goiabada, biscoitos, pão fresquinho, manteiga, leite, umas broinhas de milho que eu fiz hoje de manhã e a Mayara me disse que você gosta desse negócio de morango aqui, então eu comprei uma latinha. Agora senta querido e come. Você também, velha teimosa! Come pra depois ir dar uma caminhada com o menino. — a atmosfera naquela casa era muito agradável, Paulo se sentia seguro e querido com as duas idosas.

— Isso mesmo menino, tome um bom café da manhã, para sairmos dar a minha caminhada depois. O médico disse que eu tenho de andar pelo menos 45 minutos todos os dias, então eu vou até a pracinha, compro um jornal, às vezes pego algo para a Lola no mercadinho e volto para casa. Não é nenhuma odisséia, mas dá pro gasto. — Declarou Joana para em seguida tomar um gole de café puro.

— O que é uma “edisséia”? — perguntou Paulo que já havia comido alguns pães de queijo e dado uma mordida em uma broinha de milho.

— Ah filho, é um livro sobre um grupo de homens que saem em uma aventura de navio... Um dia desses ainda leio uns trechos para você. Mas aqui eu quis dizer que não era nenhuma viagem longa, é só uma pequena caminhada. — Joana fez um agrado no cabelo do menino o que o fez rir.

— Gosto do garoto, ele tem curiosidade! Me lembra da nossa menina na idade dele... — complementou a idosa indígena ao que Lola concordou com um meneio de cabeça e um pequeno sorriso.

 Enquanto Paulo saiu com Joana para a caminhada, Lola disse que ia dar um jeito na louça, ao que a esposa rebateu com “vai descansar mulher, é domingo! Quando eu voltar lavo pra você” e após uma breve discussão amigável, Lola resolveu aceitar a oferta da esposa.

Paulo andava no passo lento da idosa, que se apoiava em uma bengala. Desde o ataque cardíaco, muita coisa precisou ser mudada na vida de Joana, boa parte ela não gostou e mais da metade ela não aprovou, mas após o ultimato da esposa, “Quer ter outro infarto e me deixar viúva?” a idosa acabou cedendo.

Uma das coisas das quais teve de abrir mão foram os cigarros. Ela não fumava mais, com exceção de um cigarro as escondidas durante suas caminhadas diárias. Eles queriam lhe arrancar todos os vícios e não queriam que ela enlouquecesse! Ela sempre fumava um quando chegava na pracinha, mas hoje o garoto estava junto.

Quando enfim chegaram a tal praça, a mulher se sentou de forma ruidosa em um dos bancos de pedra e viu o menino fazer o mesmo ao seu lado, mas sem todo o barulho e grunhidos de dor.

— Diga Paulo, o que acha de ir até ali na banca de revistas buscar um jornal para mim? Pede para o vendedor o jornal para a Joana, ele sabe qual é. E daí, compra alguma coisa com o troco, uma revistinha ou um doce. Vai que eu fico aqui te olhando. — ela entregou uma nota de dez reais na mão do menino e o viu correr com alegria até a banca.

Talvez não fosse tempo suficiente, mas tinha de arriscar. Pescou o maço quase vazio de cigarros e o isqueiro de dentro do casaco, acendeu um e tragou um pouco, mas mal tinha começado a fumar, viu o menino voltar correndo feliz, o jornal debaixo do braço e um gibi da turma da Mônica na outra mão.

— O moço disse que ainda tinha troco, ta aqui. — entregou as moedas para a mulher que após olhá-las por alguns segundos as devolveu para ele, dizendo “Pode ficar, filho”. Ela estava fumando, Paulo notou isso assim que estava voltando da banca e já tinha ouvido Mayara falando com seu irmão de como junto de Lola, tinham convencido Joana a parar, pois era um habito ruim.

Ele não sabia o que significava “habito”, mas entendia o que era “ruim” e por isso permaneceu encarando a idosa com um olhar vidrado enquanto ela colocava aquilo na boca e soltava uma nuvem densa de fumaça branca.

— Alguém falou para você que eu não devia mais fumar? — Joana perguntou e em resposta viu o menino concordar com um meneio positivo de cabeça. Isso fez com que Ela suspirasse cansada, pois precisaria dar um jeito do menino não falar.

— Olha, eu não fumo mais. Digo, exceto por este aqui. Eu fumava muito, admito e isso também foi responsável por eu ter ficado doente, mas filho, você precisa entender que quando alguém faz algo por muito tempo, como fumar, por exemplo, é impossível arrancar tudo da pessoa de uma só vez. — ela jogou o cigarro pela metade no chão e pisou nele com a ponta da bengala, para em seguida se inclinar e pegar o toco apagado.

— Não quero que você aprenda algo errado, então não vou pedir para mentir, mas será que pode prometer que não vai contar que me viu fumando?  Eu sou uma velha com tão poucas alegrias, filho... — a forma como Joana o chamava de “filho” fazia o menino se sentir importante e por isso ele resolveu manter segredo sobre aquele pequeno “hábito feio”.

— É só um por dia mesmo? — o menino perguntou por fim e em resposta Joana sorriu e respondeu que sim, era apenas um e ainda complementou com “e é um hábito horrível, filho, você jamais deve fumar, me entendeu? Faz muito mal pra você!

Paulo quis perguntar se era tão ruim, então por que ela continuava, mas a idosa parecia ter “ouvido” e respondeu enquanto se levantava do banco e ia até um latão de lixo descartar o cigarro apagado.

— Sabe filho, vou te contar uma coisa que ninguém me disse quando eu comecei a fumar. Uma vez que você começa um vicio, é muito difícil de parar. Então a minha dica para você é nunca comece, pois daí nunca ficará impossível de parar. Agora vem, vamos voltar para casa. Me dá aqui a sua mão. — ele segurou na mão morna e vincada da idosa,enquanto ela se apoiava na bengala com a outra mão e levava o jornal dobrado embaixo do braço.

Caminhavam em passos lentos e conforme avançavam, Paulo pensava no que havia aprendido naquele final de semana na casa das suas avós. Muita informação útil e alguns conselhos assustadores.

Continua...

 

Nota da autora:

E estamos de volta a nossa programação normal!

Obrigada a você que chegou até aqui, e eu espero que esteja se divertindo com a narrativa.

Aqui tivemos o desfecho da discussão do Diego com o Marcelo, que resultou numa lemon... E um pouquinho dos outros personagens, incluindo a Joana, que fuma escondido. Todo mundo que tem um parente idoso na família sabe como eles dão um jeito de continuar com seus hábitos, mesmo depois de alguém tentar proibi-los.

Quero aproveitar aqui e agradecer a Millacoca e Maluesfegh por acompanharem os capítulos e sempre favoritarem, eu fico muito feliz de ver que vocês gostam de acompanhar a história. E também a Lucienerdepaulo que vem lendo um capítulo por dia,  espero que quando você chegar nesse aqui, veja esta nota.

E para as demais pessoas que estão acompanhando, muito obrigada por continuarem aqui, tem sido uma jornada bem longa, mas me deixa feliz de saber que vocês continuam acompanhando.

Obrigada por ler e até o próximo capitulo,

Perséfone Tenou

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