Entrou no quarto pequeno que divida com Sophier e o encontrou ainda adormecido na cama de solteiro, completamente esparramado, os lábios entreabertos buscando ar de uma forma constante. Aquela boca parecia tão convidativa, que Casper esquecendo-se do medo e do perigo que corria ao se aproximar do outro, inclinou-se sobre o mesmo e deixou que suas bocas se tocassem em um beijo suave e rápido, que foi sentido mais pelo que estava desperto, do que pelo que estava adormecido, o qual parecia indiferente ao fato.
O
coração de Casper estava disparado, batendo como louco dentro do peito e
causando arrepios por toda sua espinha, tocou os próprios lábios com as pontas
dos dedos, apreciando o momento que havia acabado de ocorrer e pensando se um
dia poderia fazer aquilo com o mesmo desperto e ciente do que estava
acontecendo.
Afastou-se
da cama e sentou-se na cadeira que havia próximo a porta, fitando o amigo que
ainda dormia. Enfiou então a mão dentro do bolso do casaco, enchendo-a com as
notas que havia recebido como pagamento adiantado pelo concerto que faria na
mansão dos Canterville. Não via a hora de Sophier acordar para poder lhe contar
sobre esta nova chance de mostrar sua música, mas sabia que o outro era um
verdadeiro animal noturno, daqueles que só despertavam quando o sol começava a
adentrar no horizonte. Por isso, ele esperou pacientemente sentado na cadeira,
que o mesmo despertasse.
***
Sophier abriu os olhos sentindo o calor
cálido da noite que começava a nascer, espreguiçou-se na cama pequena e ao
virar a cabeça para o lado, viu Casper que dormia sentado na cadeira próxima a
porta, completamente desconfortável. Sentiu pena do amigo e levantou-se para
despertá-lo. Tocou-o no braço, mas não houve resposta, então chacoalhou-o até
que finalmente abriu os olhos, piscando debilmente para em seguida sorrir de
forma cálida, o que afastou qual quer sentimento de indignação que pudesse
estar envolvendo o coração de Sophier.
–
Lugar de dormir é na cama. – disse o poeta enquanto virava-se de costas para o
amigo, indo em direção ao armário para pegar suas roupas, iria sair.
–
Eu sei disso, mas você estava dormindo e não quis te incomodar. – foi a
resposta de Casper, ao que Sophier apenas riu divertido enquanto retirava a
roupa de dormir, exibindo suas costas nuas para um Casper exasperado, que
desviou o olhar rapidamente ao perceber que seu corpo começava a responder.
–
Você não sabe o que me aconteceu hoje. – Disse o músico ao outro que perguntou
o que havia ocorrido. Este então contou sobre todo o episódio com o Duque de
Canterville e de como ele havia se emocionado com a sua música.
–
E ele me convidou para tocar em uma festa que fará daqui três semanas. –
complementou Casper completamente feliz, ao que Sophier apenas respondeu com um
muxoxo incomodo.
O pianista olhou para as costas do
amigo tentando entender o que significava aquele som desconfortável, era como
se o amigo não estivesse feliz pelo fato de ele ter conseguido um trabalho.
Meneou a cabeça para os lados tentando espantar tal impressão absurda e sorrindo
perguntou o que o amigo achava daquilo tudo.
–
Sinceramente, acho um péssimo negócio. O Duque é conhecido por seus hábitos
devassos e pervertidos e com certeza está querendo te atrair para a festa com
outras intenções além de tocar piano. – disse o poeta enquanto abotoava a
camisa branca.
–
Tem certeza de algo assim? – indagou Casper, completamente surpreso. Claro que
havia ouvido histórias sobre as perversões sexuais do Duque de Canterville, mas
nunca conseguiu acreditar muito nelas, tão absurdas as mesmas eram.
Sophier parou a sua frente,
completamente vestido e segurando a cartola alta com os dedos enluvados.
Olhava-o de cima e tal sensação fez com que o músico se sentisse pequeno e
fraco, e tal impressão não era algo agradável de passar, por isso levantou-se,
ficando agora a poucos centímetros de diferença da altura do amigo.
–
Você vem ou não? – foi a pergunta que saiu daqueles lábios que havia beijado há
poucas horas atrás. A boca macia e rosada erguendo-se em um sorriso sedutor que
fez o coração de Casper falhar uma batida enquanto ele balbuciava uma resposta
ininteligível, que causou uma onda repentina de riso em Sophier.
–
Vá se aprontar então, pois a noite será longa. – com tal conselho, eles
trocaram de lugar e o poeta sentou-se na cadeira onde até então estava o
compositor. Esperando que este se arrumasse para que pudessem sair para farrear
mais uma noite.
Minutos depois a cena se repetia agora
Casper estava em pé na frente do outro, fitando-o e tal sensação era muito
prazerosa, olhá-lo de cima, causava algo em seu ego que não conseguia
compreender, mas era bom. O contato visual foi quebrado quando o poeta se
levantou, saindo do quarto e deixando a porta aberta em um convite mudo para
que o compositor o seguisse.
E estavam na rua agora, caminhando lado
a lado com suas roupas elegantes, cartolas recobertas de cetim e as bengalas
com enfeites cromados que atraiam os olhares alheios. Passavam bem por dois
distintos cavalheiros da alta-sociedade, quando na verdade eram apenas um par
de boêmios com pouco dinheiro no bolso e muitas idéias para se divertir durante
a noite.
***
Voltaram à taberna na qual estiveram na
noite anterior e instalaram-se em uma das mesas mais afastadas, e em poucos
minutos Archibalde e Anrie juntaram-se a eles, iniciando uma noite de farra
boêmia que duraria até o amanhecer.
Sorrindo de canto, Anrie tirou de
dentro do casaco uma garrafa que continha um liquido esverdeado, juntamente com
uma colher furada e um pequeno frasco com um conta-gotas, onde se podia ler em
letras caprichosas a palavra “láudano”. Por isso a escolha de um local afastado
dos olhos alheios, pois experimentariam naquele momento os efeitos da “fada
verde”.* Anrie destampou a garrafa e pegando as taças dos amigos que estavam
sobre a mesa, colocou a colher sobre cada uma, e em cima da mesma um torrão de
açúcar, para logo em seguida pingar duas gotas do láudano, observando o liquido
verde-esmeralda cair do gargalo da garrafa para dentro dos copos, derretendo o
açúcar e misturando o veneno a bebida.
Finalmente, após ter servido a todos os
quatro, Anrie pegou uma das taças e a ergueu na frente do corpo, ameaçando
fazer um brinde, elevou-a então na altura do rosto e disse com um sorriso
jocoso nos lábios.
–
Um brinde a nós, pobres boêmios, perdidos nesta noite ingrata! – todos os três
concordaram eergueram suas taças para acompanhar o outro, tilintando-as em um
gesto de comemoração.
Casper bebericou um pouco do liquido e
lançou um olhar de soslaio para Sophier, que virava a sua taça com violência,
para logo em seguida pedir nova rodada ao amigo. Tentou alertá-lo para se
conter na bebedeira, pois não estaria apto a carregá-lo de volta para casa
naquela noite, mas Sophier apenas o ignorou com um gesto de mão, como se
espantasse algo incomodo e continuou bebendo.
Em pouco tempo, aproximadamente uma
hora, a garrafa estava vazia e o vidro de láudano pela metade. Todos os quatro
pareciam completamente aéreos, vendo coisas que não existiam ali e apontando
para locais onde nada havia. Alucinados e bêbados, foram colocados para fora da
taberna com muito menos cuidado do que na noite anterior. Simplesmente
enxotados para a rua.
Quatro corpos vacilantes que oscilavam
para frente e para trás, completamente embriagados, perguntavam-se onde
poderiam ir para acabar com a noite. Archibalde sugeriu um bordel, mas os
outros três não tinham dinheiro suficiente (ao que Casper deu graças), Sophier
deu a idéia de irem a outra taberna, que não barrasse a entrada deles, mas a idéia
também foi descartada, pelo fato de que todas estavam fechando as portas e
expulsando seus bêbados.
–
Só sobrou a casa de ópio do Cheng... – disse Anrie desanimado enquanto
apoiava-se no ombro de Archibalde, para manter-se em pé, tamanho era o desequilíbrio
que sentia devido às inúmeras doses de absinto.
–
Não, aquele lugar esta decaindo, e semana passada a policia fez uma inspeção e tomou
boa parte do meu dinheiro.* – reclamou Casper enquanto começava a caminhar,
trançando as pernas, como qual quer bom ébrio faz.
–
Então vamos prá casa... Tenho um ótimo vinho que foi presente do meu pai,
podemos abri-lo e beber enquanto lemos nossos poemas e Casper toca alguma
coisa... – Ofereceu Sophier, caminhando ao lado do amigo músico e segurando-o
pelo pescoço, em uma tentativa de se manter aprumado.
–
Não, nós vamos para casa... Amanhã Archibalde tem um encontro com um possível
comprador de seus poemas e eu também. – informou Anrie, puxando o amigo pelo
pescoço para o outro lado da rua. Foi quando Sophier parou e disse em voz alta.
–
Vocês sabiam que Casper também tem um serviço? Pois é, ele vai tocar no baile
do Duque de Canterville. – o jovem compositor notou os olhares que os outros
dois amigos trocaram e sentiu-se desconfortável, a fama do Duque era tanta assim?
–
Bem... Isso parece... Bom, Casper. Boa sorte. – desejou Archibalde enquanto se
afastava com Anrie cujo braço continuava enroscado em seu pescoço.
Casper sentiu a indignação crescer em
seu peito, parecia que todos estavam contra ele e seu novo trabalho, pelo menos
era a impressão que tivera ao ver aquela troca de olhares por parte dos outros
dois. Abanando a cabeça para afastar tal
pensamento, Casper pegou Sophier e colocando um dos braços do outro em volta de
seu pescoço, o ajudou a caminhar até o pequeno apartamento que dividiam.
***
As semanas passaram muito rapidamente e
logo chegou o dia da tão esperada festa do Duque de Canterville. Casper vestiu
seu melhor traje e ajeitou a cartola em frente o pequeno espelho que ficava na
parede do quarto. Recebendo em resposta olhares reprovadores por parte de
Sophier, que o observava da cadeira na qual estava sentado, parcialmente
vestido, com a camisa aberta e a calça por abotoar. Tal visão mexia com a
excitação de Casper e o mesmo teve de ser muito forte para não deixar nada
transparecer enquanto se aprontava para sair.
–
Estou indo Sophier. Deseje-me sorte. – disse enquanto colocava a mão na
maçaneta para sair. Foi quando ouviu a voz do outro, quase um murmúrio
arrependido.
–
Espere, eu vou com você. – O coração do jovem pianista acelerou e disparou
desesperado enquanto ele fingia-se de indiferente. Saber que o amigo iria com
ele, fez com que tudo tomasse um tom diferente e o tornou mais confiante.
Após Sophier ter terminado de se
aprontar, saíram. As capas esvoaçavam para trás, decorrente do vento forte que
fazia naquela noite, e por mais de uma vez tiveram de segurar as cartolas para
que estas não saíssem voando pelas ruas estreitas de Londres. Não trocaram uma
única palavra durante todo o trajeto até a majestosa mansão do Duque, a qual
estava iluminada com milhares de pequenas luzes de lampiões e enfeitada com
fitas de cetim em cores fortes e chamativas.
Pararam aos pés da escada que levava
até a porta de entrada e Casper lançou um olhar cheio de significados ocultos
para Sophier, o qual sorriu de forma amarela, enquanto fazia um gesto de
cabeça, indicando para que ele subisse. Obedeceu-o e reticente puxou o batedor
da porta, ouvindo o som ecoar pelo cômodo à dentro e em poucos segundos um rosto
pálido e impassível surgiu, era o mordomo.
–
Boa noite, meu nome é Casper Wilmore, eu vim para me apresentar como pianista
na festa do Duque... E aquele é meu amigo, Sophier Duprox. – o mordomo os mediu
de cima a baixo e então abriu a porta para que entrasse, informando que a festa
já havia começado e o Duque estava ansioso para vê-lo.
–
O Duque não gosta de atrasos. – o mordomo frisou enquanto caminhava na frente
dos dois, levando-os até o salão de festas, onde um burburinho incômodo de
vozes se levantava, enchendo os ouvidos de ambos.
Ao
entrarem na grande sala, vários rostos se viraram para encará-los e Casper
sentiu-se como se fosse um animal raro para exibição em um zoológico. Pode
ouvir risinhos abafados de algumas damas bem vestidas com penteados
extremamente elaborados que se escondiam atrás de seus leques e tosses mal
disfarçadas de cavalheiros distintos, que na verdade foram dadas para ocultar
risos zombeteiros. Sentiu-se cada vez mais mergulhado em uma armadilha da qual
não havia como escapar.
Vislumbrou
então as costas do Duque, o qual o mordomo foi chamar. O homem estava trajando
um casaco bordado com fios dourados, que formavam um desenho lidíssimo em todo
o tecido e tinha os longos cabelos castanhos presos em um rabo de cavalo baixo,
amarrado com uma fita. Ao ouvir as informações que o serviçal foi lhe dar, o
Duque girou nos calcanhares e veio em sua direção, braços abertos como se
recebesse um amigo que há muito não via. Abraçou-o mais forte do que o normal,
fazendo-o quase ficar sem ar nos pulmões e ao soltá-lo, apresentou-o a todos da
festa como “a grande descoberta musical do século”.
Ficou encabulado com tal declaração do
Duque, e por alguns segundos esqueceu-se da presença de Sophier no recinto, até
que seu olhar bateu na silhueta do mesmo, em pé, próximo as colunas do salão de
festas, completamente deslocado. Desvencilhou-se então do abraço do Duque e foi
em direção ao amigo, puxando-o pela mão para apresentá-lo ao outro.
–
Duque de Canterville, este é meu amigo, Sophier Duprox. Ele é poeta. –
acrescentou ao receber um olhar de dúvida do Duque, que tentava talvez
descobrir como os dois se conheciam. O que Casper não notou foi o olhar de
desprezo que o Duque dispensou para Sophier, como se este não passasse de um
verme, algo que poderia ser descartado a qual quer instante.
–
Bem, apresentações feitas, esta na hora de você tocar algo para nós, não é
mesmo, meu caro rapaz? – indagou o Duque, enquanto puxava o pianista para longe
do outro, lançando para o mesmo um olhar por sobre o ombro que parecia dizer “a
vitória é minha”.
Sentou-se na banqueta do piano de cauda
e após abrir as partituras que havia trazido consigo e estralar os dedos,
começou a executar a peça que havia composto pensando em Sophier. Sentia cada
nota fluir por dentro dele e se espalhar pelo salão, no qual nenhum único ruído
era ouvido. Estava tudo em suspenso enquanto ele executava aquela peça única,
que trazia lágrimas aos olhos das damas e dos cavalheiros, os quais disfarçavam
sutilmente fingindo que algo incomodava seus olhos. Casper não sabia, mas
aquela melodia tocou o coração de Sophier, o qual deixou as lágrimas caírem
livres pelo seu rosto macio e belo.
Inclinando-se sobre as teclas de tempos
em tempos, Casper tocava com paixão a triste melodia que a todos emocionava,
até que seus dedos foram parando e finalmente a peça chegou ao fim. Ele então
ouviu uma salva de palmas que caíram sobre si como uma chuva suave de se ouvir.
Levantou-se e fez a mesura comum aos pianistas, um dos braços na frente do
abdômen e outro atrás, inclinando-se suavemente para frente.
Tocou mais algumas peças, desta vez
coisas compostas por outros autores, mas tão boas ou até melhores que as suas
composições, pelo menos a seu ver. A festa fluía bem e após a recepção
acalorada por parte do Duque, o mesmo não se aproximara dele mais nenhuma vez,
para sua surpresa, pois esperava que os boatos que Sophier e os outros haviam
lhe dito fossem verdade.
Foi quando taças de vinho tinto foram
servidas para todos os convidados. Inclusive para Casper e Sophier, o qual
notou que o Duque fazia um gesto para uma dama de busto farto, que se abanava
desesperadamente com o leque. Ele a viu se aproximar de Casper e fingir
tropeçar em algo, apenas para fazê-lo derrubar o vinho sobre si mesmo.
Observava tudo a distancia, enquanto não sentisse ameaça, não iria interferir.
–
Olhe só o que fez Madame Paxton, sujou a roupa do rapaz. – disse o Duque
enquanto tirava seu próprio lenço do bolso e tentava retirar a mancha de vinho
das vestes de Casper, sem sucesso, obviamente.
–
Tenho algumas mudas de roupa nos meus aposentos, se quiser se trocar... – o Duque deixou no ar, esperando pela resposta
do músico, o qual sorriu deslocado e acabou concordando, pois não poderia
continuar tocando as peças com as vestes sujas de vinho.
Caminhava a alguns passos atrás do
Duque e observava suas costas largas se movendo juntamente com os cabelos
longos do rabo de cavalo que chicoteava os ombros de tempos em tempos, até que
ele estancou em frente a uma porta fechada e virou-se em sua direção, o sorriso
gentil nos lábios delgados.
–
É aqui, no armário tem roupas que acredito eu, servirão perfeitamente em você.
– disse enquanto abria a porta o suficiente para Casper passar com folga. Este
agradeceu em um sussurro e adentrou no cômodo, ouvindo a porta ser fechada as
suas costas. Olhou para trás, confirmando estar sozinho.
Rumou até o armário e abrindo-o
encontrou uma troca completa de roupa, pegou-a e foi até o biombo no canto do
quarto, retirando a camisa primeiro que foi a parte mais atingida pelo vinho.
Deixou-a pendurada no biombo e preparava-se para tirar as calças, quando ouviu
o clique baixo da maçaneta girando. Espiou pelo lado do biombo, não encontrando
nada anormal, voltou a se despir, quando de repente sentiu uma mão que segurava
seu pescoço por trás. Com muita dificuldade olhou por sobre o ombro e encontrou
o Duque a suas costas, com um sorriso diabólico nos lábios.
–
Co... Como? – foi tudo que conseguiu
balbuciar, pois o ar estava começando a ficar escasso em sua garganta. O Duque
sorriu mais abertamente, seus olhos expressando toda uma crueldade sem limites.
–
Este quarto tem uma passagem oculta, que o liga com o cômodo ao lado. Tudo o
que tive de fazer foi distraí-lo com o barulho na maçaneta, e entrar pela porta
secreta que se encontra por trás daquela tapeçaria. – informou o Duque,
apontando para um largo quadro de tecido onde se via uma ninfa alimentando um
cavalo.
Sentiu o rosto do Duque em seu pescoço,
aspirando ao odor de sua pele e tal gesto lhe causou nojo, pois não era aquela
a sensação que queria ter, não era aquela tez que queria sentir contra a sua. A
mão em seu pescoço continuava firme, enquanto a outra passeava por seu tórax
desnudo, explorando cada pedaço de pele exposta, para total desespero do
músico, que tentava de qual quer forma fugir daquele aperto.
–
Você não tem como escapar, entenda, quando eu decido que quero algo, vou até o
fim por esse “objeto”. – sentiu-se indignado com o fato de ter sido rebaixado a
nada além de um item qualquer.
–
Solte-me! – esbravejou enquanto tentava se desvencilhar dos braços que o
prendiam, sem sucesso. O aperto em sua garganta se tornou mais forte,
impossibilitando-o de respirar e por isso ele teve de parar de se debater.
–
Muito bem, assim está melhor. – sussurrou o Duque em seu ouvido, causando uma
serie de arrepios indesejáveis por todo seu corpo seminu.
Sentiu seu corpo ser puxado para fora
do biombo e jogado sobre a cama que havia no quarto, seus cabelos negros
espalharam-se pelos travesseiros, dando a Casper um ar vulgar, aos olhos do
Duque, que continuava acariciando-o com uma das mãos, enquanto que a outra
permanecia em seu pescoço, sufocando-o e imobilizando-o.
–
Fiquei interessado em você logo que o vi no teatro há algumas semanas... Esse
rosto e estes olhos profundos que parecem invadir a minha alma, tudo isso me
atraiu muito. – sussurrou o Duque contra o ouvido de Casper, que lutava
inutilmente para se desvencilhar das mãos que o oprimiam.
–
Eu sempre consigo o que eu quero e com você não será diferente meu caro Casper.
Se parar de lutar contra mim, as coisas poderão ser muito mais prazerosas para
você. – informou o Duque enquanto acariciava o rosto do músico com os nós dos
dedos.
Casper afastou a cabeça para longe do
toque, indignado com o fato de estar sendo subjugado por um homem que não fosse
Sophier. Sentiu que um de seus braços era erguido e em seguida o outro e ambos
estavam sendo amarrados acima dele, deixando-o imobilizado, para seu total
desespero.
Suas calças foram abertas e sentiu a
mão firme do Duque sobre seu membro, que apesar de todo o ocorrido, estava
excitado, um reflexo de seu corpo, algo que não conseguia controlar. Tal constatação
trouxe um sorriso sádico nos lábios do Duque, o qual o fitou longamente
enquanto deixava sua mão invadir a roupa intima do músico, tomando sua ereção
nas mãos.
–
Parece que apesar de toda a resistência, você está gostando do que está
acontecendo aqui, não é mesmo? – Sentiu asco de si mesmo por deixar que seu
corpo esboçasse aquele tipo de reação, e fechou os olhos, desistindo de lutar,
pois ficou claro que o inevitável iria acontecer ali naquele quarto e não havia
nada que ele pudesse fazer para lutar contra aquilo.
–SPLAF–
O som pesado e seco cortou o cômodo,
sendo seguido por um grito de dor abafado. Abriu lentamente os olhos, para
encontrar uma cena no mínimo curiosa se desenrolando a sua frente. O Duque
amparava a cabeça que sangrava, com uma das mãos, enquanto Sophier, em pé há
poucos centímetros da cama, segurava uma pesada estatueta de mármore, também
manchada de sangue. Ficou claro para Casper o que havia acontecido ali, o outro
o havia salvado.
–
Como... Como ousa me agredir, seu... Seu... Boemiozinho maldito! – berrou o
Duque enquanto lançava para Sophier um olhar fulminante de pura raiva. Mas o
jovem poeta não se intimidou com aquele olhar e brandindo a estatueta como se
fosse um bastão, ameaçou acertar o outro homem novamente.
–
Você me dá nojo... Forçando uma pessoa deste jeito. – foram as únicas palavras
proferidas por Sophier, para em seguida baixar a estatueta mais uma vez sobre a
cabeça do Duque, acertando-o novamente e fazendo-o gritar de dor.
Casper assistia a cena com um misto de
felicidade e vergonha, primeiro pelo fato de que o outro viera salvá-lo, e
depois por que estava seminu da cintura para baixo e com a camisa aberta,
sentindo-se completamente exposto.
Teve suas mãos desamarradas pelo amigo,
que o amparou para que ficasse em pé e o ajudou a vestir as roupas. O Duque
permanecia no chão, a mão sobre a ferida na cabeça, olhando os dois com uma ira
crescente nos olhos claros.
Quando estavam saindo do quarto, Casper
amparado por Sophier, eles ouviram a ameaça do nobre as suas costas. A voz
repleta de um ódio incontido de alguém que tivera seus planos frustrados.
–
Você nunca mais irá conseguir vender uma única peça nesta cidade! Farei da sua
vida um inferno, meu jovem! – Casper olhou para ele por sobre o ombro e pensou
“não preciso da sua ajuda para vender minhas composições”.
Saíram da mansão sob os olhares dos
milhares de convidados e uma saraivada de comentários grosseiros sobre ambos.
Mas não se importava com isso, estava com Sophier e isso era tudo o que lhe
importava naquele momento. Havia caído em uma armadilha, mas fora salvo pelo
outro há tempo.
Após caminharem alguns metros, Sophier
parou e segurou Casper pelos ombros, fitando-o nos olhos, a lembrança da cena
que encontrou no quarto voltando a sua mente clara e nítida, o corpo seminu de
Casper completamente exposto e tal visão lhe causou uma sensação estranha e
diferente, algo que ele não conseguia explicar, mas que o incomodou bastante,
afinal de contas o outro era seu amigo.
–
Você foi avisado sobre as festas do Duque, não é mesmo? – Indagou por fim
enquanto encarava o outro nos olhos. Grandes e vítreos olhos verdes-claros, que
o fitavam com um misto de culpa e alivio.
–
Sim... Eu sei... Desculpe-me por não ter ouvido seus avisos... – Disse o músico
enquanto desviava o olhar para o lado, deslocado. Sophier sentiu então um
intenso desejo de abraçar o outro e dizer que não havia qual quer problema
naquilo, mas acabou se contendo, pois não sabia o que poderia acontecer se
fizesse tal ato.
–
Certo, vamos para casa então. – Recolocando o braço de Casper em volta de seu
pescoço, começaram a caminhar novamente, rumando em direção ao pequeno
apartamento que dividiam. Ambos com os corações repletos de dúvidas e
incertezas que ao que parecia, jamais seriam resolvidas.
Continua...
Notas
do capítulo:
“A
Fada Verde”: apelido dado ao absinto, pelo fato de que o mesmo causa uma série
de alucinações, entre elas, a visão de uma “fada verde”
“Não,
aquele lugar esta decaindo, e semana passada a policia fez uma inspeção e tomou
boa parte do meu dinheiro”: naquela época, quem ia as casas de ópio sofria com
as apreensões da policia, que tomava boa parte do dinheiro dos frequentadores e
dos donos da casa, como uma espécie de pagamento pela “vista grossa”.
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