sábado, 31 de outubro de 2020

Lar é onde o coração está - capítulo 11


Mayara chegou trinta minutos atrasada ao restaurante onde havia combinado de se encontrar com Letícia. O lugar, que ficava no bairro Higienópolis, era chique e grande e a fez se sentir um pouco intimidada e desconfortável e por isso ela teve de perguntar ao maitre se a outra moça já havia chegado, ao que o homem a indicou com um gesto leve de mão.

Sentada a uma das mesas no canto do salão estava Letícia, tomando algo de uma taça ao mesmo tempo em que conferia as horas no celular. Vê-la fazendo aquilo fez Mayara se sentir culpada, mas mesmo assim, a moça respirou fundo e atravessou o restaurante até chegar onde a outra estava.

– Oi, desculpa a demora... – começou a dizer quando viu Letícia erguer os grandes olhos castanhos da tela do celular e encará-la por alguns segundos, para em seguida esboçar um sorriso diminuto e convidá-la a se sentar na cadeira à frente.

– Eu tava quase achando que você tinha me dado o bolo... – ouviu-a dizer enquanto acomodava-se na cadeira e via o garçom se aproximar com o cardápio. Pediu mais alguns minutos para escolher antes de fazer o pedido.

– Eu te falei que tou tomando conta de um garotinho durante a semana, né? Daí hoje a assistente social ia passar lá e... – contou toda a situação para Letícia, que a ouviu com atenção, bebericando da taça a sua frente de tempo em tempo.

– Entendi, mas você podia ter me mandado um whats, mas tudo bem, o importante é que você veio. – Mayara sorriu enquanto via a outra inclinar com delicadeza a cabeça para o lado direito e sorrir. O cabelo escuro e curto emoldurava o rosto delicado dela e os brincos de argola reluziam sob a iluminação do restaurante.

Mayara respirou fundo, pois aquele era seu primeiro encontro em anos. Ao olhar para o cardápio, se surpreendeu com os preços e escolheu o prato mais barato, que ainda assim, era caro para o seu “orçamento inexistente”, mas era o que ela podia pagar.

Elas conversaram sobre amenidades para se conhecer melhor e aos poucos a noite foi passando. Mayara queria contar para a outra sobre um detalhe que poderia desacelerar aquele relacionamento, mas não encontrava o momento certo.

Na hora de pagar a conta, tentou ajudar com um valor, mas foi impedida por Letícia que disse “Eu te convidei, eu pago” que deu em seguida uma piscadinha marota para complementar a afirmação.

Quando estavam saindo, Letícia se ofereceu para lhe dar uma carona até em casa e Mayara, pensando em conhecer melhor a outra e também no valor que economizaria com o uber, aceitou. Ela falou um bocado sobre Paulo, com um carinho quase materno na voz, coisa que não passou despercebida por Letícia, que respondia os comentários da moça com animação.

Ela tinha esbarrado na outra numa loja de roupas do centro, no dia anterior, quinta-feira. Mayara estava espiando de dentro de uma das cabines dos provadores e exibia uma expressão meio desesperada no rosto. Letícia, que tinha entrado para experimentar uma blusa, viu a garota e tentando ser solicita, perguntou se havia algo errado.

– Mais ou menos, eu... Bom, entra aqui pra você ver. – quando passou para o lado de dentro da cabine, viu o que tinha acontecido e sentiu um misto de pena e vontade de rir, a qual sufocou por educação. A moça tinha um cabelo negro e longo, muito bonito e sedoso, mas, que como qualquer pessoa com cabelo comprido sabia, pode dar dor de cabeça. Vários fios tinham prendido no zíper de um vestido que a outra tentava experimentar. 

– Eu costumo prender o cabelo num coque quando vou provar uma roupa, pra evitar que fique enroscando em tudo, mas hoje esqueci e... Ai que vergonha! – a voz dela era suave e agradável e, Letícia não conseguiu deixar de notar as curvas bonitas da cintura e o contorno macio dos seios que espiavam pelo decote do vestido e claro, os olhos, negros e profundos.

– Hmm, deixa eu tentar desembaraçar. – levou quase dez minutos, mas, conseguiu remover todos os fios que ainda estavam ligados ao couro cabeludo da outra moça, que quando pode em fim retirar o vestido, exibindo um conjunto de lingerie delicado com desenhos petit-poá, a qual suspirou aliviada.

– Obrigada, eu achei que ia ter de sair assim, chamar uma das vendedoras e talvez até... Ter de cortar um pedaço do cabelo. – as últimas sete palavras saíram num tom sussurrado e desesperador.

– Que bom que deu certo, então... – Letícia queria convidá-la pra sair, mas tinha receio de levar um fora ou algo pior. Estava quase do lado externo da cabine, quando sentiu a mão macia da outra segurar seu pulso e a ouviu dizer num tom melodioso.

– Eu queria agradecer pela ajuda. – em resposta, Letícia virou-se, ficando uns centímetros da outra moça, que era alguns centímetros mais alta do que ela e por isso, a observava de cima.

– Er, posso te convidar pra jantar? – perguntou, receosa, ao que em resposta recebeu aquele sorriso bonito e cativante da moça, que ainda estava trajando apenas a combinação de lingerie. Mas, naquele momento Letícia estava mais interessada no sorriso hipnotizante do que em ficar observando as curvas da outra.

– Era eu quem devia te convidar, né? – ambas riram e combinaram de se encontrar no dia seguinte. Letícia disse que mandaria o endereço do restaurante e o horário por whats.

E agora estavam ali, com ela levando à outra pra casa! Será que as coisas iriam avançar naquela noite? Era o que se perguntava enquanto virava a ultima esquina e estacionava em frente da casa simples de portão baixo que Mayara informou ser onde morava.

– Bom, então é isso... Obrigada pelo convite de hoje, eu me diverti muito. – abriu a porta do carro e estava quase descendo quando sentiu seu cotovelo ser segurado com cuidado pelos dedos longos de Letícia e no mesmo instante, uma batida falhou em seu peito.

Ao olhar para trás, viu que a outra moça se aproximava, em um gesto que transmitia o desejo de beijá-la. Em resposta, Mayara se virou para a outra e a afastou com um gesto delicado.

– Eu achei que podia esperar mais um pouco pra te contar, mas, se você gosta mesmo de mim, é melhor saber agora. – Letícia pensou em uma série de possibilidades, desde Mayara ter um namorado até ela não estar correspondendo seus sentimentos, mas, o que ouviu foi tranquilizador.

– Eu sou demissexual. – era só isso? Não tinha problema. Tinha alguns amigos que faziam parte deste espectro da assexualidade, pessoas que só conseguem se relacionar sexual e romanticamente após algum tempo de convivência e só quando criam um laço emocional, mas, achou melhor não falar nada ou acabaria magoando a outra.

– E isso é ruim por que...? – deixou no ar, esperando que Mayara se manifestasse. Viu ela suspirar em um misto de alivio e cansaço e responder que, por ela ser demi, isso fazia com que a forma como sentia atração sexual e romântica fosse bastante instável.

– A última vez que eu me apaixonei mesmo por uma pessoa, era uma moça, foi há mais de seis anos e não deu muito certo porque, meu desejo sexual é baixíssimo e muito esporádico. – Mayara se sentia desconfortável de expor sua sexualidade, mas sabia que era o melhor deixar tudo claro antes que Letícia pensasse que elas poderiam desenvolver algum relacionamento juntas.

– E o que você gosta de fazer? Digo, de um modo geral? – A voz de Letícia tinha um tom calmante que fez com que a ansiedade de Mayara desse uma trégua.

– Eu gosto de ficar junto da pessoa, sair pra passear, ir ao cinema, ficar abraçada vendo séries na tevê. É que eu não sinto uma urgência emocional de fazer sexo sempre, sabe? As vezes até fico a fim, mas é algo raro e eu te achei muito legal e acredito que talvez, com o tempo, posso desenvolver sentimentos por você, mas por agora... – sentiu Letícia segurar sua mão a qual ela beijou com suavidade.

– Eu já gosto de você, Mayara, mas vou esperar até que se torne recíproco. Por enquanto, isso aqui é o suficiente pra mim. – ela se referia ao beijo nas costas da sua mão. Em resposta, antes de descer do carro, Mayara depositou um suave beijo na bochecha da outra e respondeu de forma tímida.

– Desculpe jogar essa informação em cima de você na primeira vez que a gente sai juntas, mas é que eu quero muito que dê certo e precisava te dizer antes que as coisas caminhassem mais e você se decepcionasse. – viu Letícia sorrir e concordar com um gesto de cabeça e então, sentindo-se mais confiante, Mayara desceu do carro, mas antes de entrar em casa, inclinou-se na janela do carro e perguntou.

– Sei que está meio em cima, mas amanhã dois amigos meus vão fazer um jantar para celebrar um ano de casados e eu queria saber se... Você gostaria de ir comigo? – Letícia piscou algumas vezes, maravilhada com o rosto bonito de traços indígenas da outra moça e a forma como o cabelo negro e macio caia em cascata sobre o ombro direito, por isso, demorou alguns segundos para responder.

– Claro! Eu quero sim! Passo te buscar aqui... – Mayara concordou e elas marcaram pras 19h30.

– Isso é um encontro? – perguntou Letícia sorrindo, ao que a outra respondeu, enquanto dava uma piscadela simpática.

– Pode apostar que sim.

Continua...


*

*


Nota da autora:

Eu tinha me comprometido a só fazer uma nota no ultimo capítulo da história, mas, me dei conta de que precisava fazer um agora. Pra quem acompanha a história, deve ter notado que eu fiquei 2 semanas sem atualizar ela e o maior motivo é a falta de feedback.

Se você vem até aqui todo final de semana pra ler os capítulos, deixe um comentário pra eu saber que eu tenho gente acompanhando a história – de outra forma, eu vou acabar abandonando por falta de leitores.

E não precisa ser nenhum super comentário rebuscado, pode ser só um “oi, tou acompanhando aqui, continua” ou algo do tipo.

O fato é que falta de feedback pra uma autora que escreve e publica gratuitamente, é algo que mata a vontade de continuar escrevendo e confesso que manter o ritmo semanal nessa aqui é um desafio bem cansativo – por causa da depressão e ansiedade crônicas que eu tenho, qualquer tarefa é um desafio, na verdade.

Então é isso, se você está lendo isso aqui, por favor, deixe um comentário, um sinal de que você está acompanhando a história e se você não tem conta nesse site, eu tenho uma página no FB, um perfil no Instagram e uma conta no Twitter, todas sob o nome de “Perséfone Tenou Writer”, então, pode mandar seu feedback por qualquer uma dessas redes sociais, só... Dê um sinal de que eu não estou escrevendo pras paredes.


Obrigada. 

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