sábado, 6 de novembro de 2021

Lar é onde o coração está - capítulo 38

Mayara se despediu de Marcelo e entrou em casa, dando um beijo rápido na testa de Joana, que estava na sala assistindo o jornal com um copo de café na mão e passou pelo quarto das mães para dar outro beijo, agora em Dolores e então correr para o banheiro onde tomou um banho rápido.


Enquanto o cabelo longo e macio estava enrolado dentro da toalha, a moça escolhia qual roupa usar e no fim acabou optando pelo vestido com estampas de morango que Diego tinha lhe dado há alguns meses. Calçou uma sandália sem salto e passou uma maquiagem leve, dando atenção extra para os lábios, os quais ela recobriu com um batom vermelho vivo cremoso. Depois de terminar de se aprontar e confirmar pelo reflexo do espelho que sim, estava bonita, Mayara desceu as escadas com velocidade e para sua surpresa encontrou Letícia sendo recebida pelas suas duas mães.

– Querida, a Letícia disse que veio te buscar para vocês irem a um show, é isso meu bem?  – perguntou Dolores enquanto entregava um copo de suco para a outra moça que agradeceu e informou que elas iriam à virada cultural.

Na verdade, Letícia demorou alguns segundos para responder a idosa, pois ao ver Mayara ao pé da escada, ela sentiu que o mundo ao seu redor havia parado. A outra estava tão linda naquele vestido e com os cabelos longos e sedosos presos numa trança jogada por sobre o ombro esquerdo. E Mayara sentiu aquele olhar fixo e experimentou a sensação de seu rosto esquentando e o coração batendo forte no peito.

– Então, que horas você volta para casa Mayara? – Joana perguntou ao mesmo tempo em que mudava de canal de forma frenética.

– Não sei mãe, acho que lá pela meia-noite talvez. Mas pode deixar que eu ligo pra vocês ainda hoje e a gente não vai beber, então não tem risco de acidente. – beijou a mãe que estava sentada numa poltrona no canto da sala e sentiu a mão morna da mulher acariciar seu rosto com carinho e a ouviu sussurrar “Tome cuidado, minha filha”.

Em seguida deu outro beijo rápido na bochecha da outra mãe que enfiou umas notas de reais na sua mão e disse, enquanto lhe dava um abraço “pra vocês comprarem alguma coisinha”.

– Até logo dona Joana, dona Dolores. Eu prometo que trago ela de volta antes de virar abóbora. – Letícia apertou a mão das duas idosas e apesar de sentir que Joana ainda tinha algum receio quanto a ela, a outra mãe, Dolores, passava a sensação de que confiava totalmente nela.

Elas entraram no carro, Mayara estava ao seu lado, a saia do vestido tinha subido um pouco exibindo aquelas coxas bonitas de um tom caramelo. Letícia tentou não encarar e apesar do esforço que teve de fazer, logo estava olhando pelo retrovisor para sair da frente da casa da moça.

– Sua mãe Joana ainda não gosta muito de mim... – ouviu a outra moça rir divertida e suspirou aliviada, afinal não queria passar a impressão que não gostava de uma das sogras.

– Ela é meio rabugenta, mas acredite, ela gosta de você sim. Eu contei que quando ela teve o infarto, foi você que me deu apoio e tudo o mais. Ela só é meio... Bom, daquele jeito. – ouviu o tilintar das pulseiras no braço da moça sentada no banco do passageiro e sentiu o aroma suave do perfume dela conforme o vento entrava pela janela.

– Então, pronta pra se divertir? – perguntou Letícia enquanto virava numa esquina e ouvindo em resposta aquela risada deliciosa que amava seguida de “E como!

***

Marcelo tinha acabado de entrar em casa. Conferiu no quarto de Paulo e encontrou o menino adormecido, um pé para fora da cama, metade dos lençóis atirados no chão. Entrou com cuidado e cobriu o menino direito, encostando a porta na saída. Pelo som que saia do banheiro, Diego devia estar tomando banho e ele achou melhor dar ao outro algum espaço e rumou para a cozinha, onde pegou um copo de suco e então se sentou em frente à tevê, procurando algo para assistir.

Estava imerso num filme antigo que achou em um dos canais, tanto que nem percebeu a presença do marido ao seu lado, até que ele tocou seu ombro.

– Oi estranho. – Diego murmurou enquanto se sentava ao lado do outro no sofá. Enquanto Marcelo foi levar Mayara em casa, ele serviu um lanche leve pro irmãozinho e deixou que o menino contasse a ele sobre seu dia e só quando começou a notar os sinais de sono é que sugeriu que Paulo fosse dormir. Isso era por volta das 20h00.

– Ei. Como foi seu dia? – sentiu Diego deitar a cabeça no seu ombro e suspirar cansado, encarando a tevê por alguns segundos antes de responder que o dia tinha sido exaustivo, ele fez varias visitas a imóveis com possíveis compradores e locadores, mas no fim só conseguiu um contrato para aluguel.

– E você? Muitos pacientes na clínica? – naquele dia Marcelo não teve muitos compromissos, atendeu uma senhora com hérnia de disco e um jovem que fazia acupuntura como tratamento complementar para ansiedade.

– Eu gosto de ficar assim às vezes, só nós dois, assistindo um filme na tevê, sem me preocupar com nada. Faz tempo que a gente não fica assim, né? – Marcelo abraçou o marido pelos ombros e beijou-o na têmpora direita e o ouviu suspirar cansado. Diego tentava se fazer de forte o tempo todo na frente de todo mundo, mas as vezes era bom poder ver aquele outro lado dele.  

***

Após guardarem o carro num estacionamento, Letícia e Mayara caminharam até a praça onde os shows estavam acontecendo. No caminho havia muita gente e em certo momento Letícia ficou para trás e perdeu a outra moça de vista, ficando preocupada, mas, se surpreendeu ao sentir uma mão macia e morna segurar a sua com firmeza e ao olhar, encontrou Mayara que lhe sorriu de forma cativante e a puxou para perto de si.

– Segura firme pra não se perder. – Ela havia decidido que não ia avançar o sinal, não tocaria Mayara a menos que ela tomasse a iniciativa, não tentaria nada físico ou intimo sem a permissão da outra moça. Claro que aquilo a estava torturando, mas decidiu que valia a pena se fosse por Mayara.

Elas se enfiaram no meio da multidão e assistiram ao show que estava acontecendo naquele momento. Mayara ainda estava segurando a mão de Letícia.

Viram mais uns dois shows até que Letícia disse que precisava tomar uma água. Na verdade, ela teve de gritar, mas pareceu que a outra moça não se incomodou com isso. Elas saíram do meio da multidão ainda de mãos dadas e sorrindo e pegaram duas garrafinhas de água de um ambulante que passava por ali.

– Eu nunca tinha vindo na virada cultural, sabe? Está sendo muito legal! – confessou Mayara enquanto se sentava na calçada, esticando as pernas e soltando um resmungo d e dor. Tinham ficado horas em pé.

– Também não! Minha ex-namorada não gostava de multidões então eu evitava ir a lugares assim. – sentou-se ao lado da outra moça e sentiu que seus músculos estavam precisando daquele descanso também.

– Como era sua ex? – a pergunta soou meio surpreendente, afinal quem pergunta sobre a ex da sua namorada? Mas, ao olhar para o rosto de Mayara, viu que a moça exibia apenas curiosidade genuína.

– A Leila? Ela era legal, era artista plástica, vendia quadros pra uma galeria de arte lá em Higienópolis, a gente até que se dava bem, mas nos últimos meses estava ficando meio difícil porque ela disse que eu não me encaixava no padrão futuro de vida dela. Sei lá, acho que era porque as pinturas começaram a fazer sucesso no exterior e eu... Bom, acho que eu não tinha a aparência que ela queria exibir por ai. – tomou um gole grande de água e demorou em engolir, numa tentativa de evitar dizer algo mais.

– Eu tive uma ex meio assim também, digo, na verdade era diferente. Ela não era artista plástica, trabalhava como vendedora numa loja de roupas de grife naquele shopping chique, você sabe qual né? Meu problema com ela na verdade era por que... Bom... Ela ficava me pressionando para fazer... Coisas mais íntimas e a gente tava junta há nem dois meses e bom... Eu não em sentia confortável. – viu Mayara esconder o rosto com uma das mãos enquanto sorria nervosa.

Num gesto impulsivo Letícia segurou a outra mão da moça e beijou as costas desta com carinho, ganhando a atenção de Mayara que a encarou com grandes olhos negros arregalados. Olhos que a outra moça achou lindos.

– Eu sei que a gente tá saindo há mais tempo que isso e que passamos por mais algumas coisas juntas, mas eu queria dizer que eu nunca vou te forçar. Não vou mentir, eu quero muito te tocar e te beijar e experimentar a sensação de poder tocar a sua pele, mas eu não vou fazer isso até você me dar permissão, porque eu me apaixonei por você Mayara e decidi que vou esperar o quanto for para poder me aproximar de você. – ela ouviu aquelas palavras e sentiu como se algo estivesse para transbordar de dentro de si e naquele momento Mayara sentiu que amava Letícia um pouco mais, o suficiente para envolver a outra com os braços e tomar um beijo dos lábios dela com carinho.

A surpresa do gesto pegou Letícia de surpresa, mas a moça correspondeu com rapidez, envolvendo os ombros da namorada com carinho enquanto sentia os lábios mornos dela pressionarem os seus e se entreabrirem aos poucos, dando permissão para um aprofundamento do contato.

Quando se afastaram, ambas estavam ofegantes e coradas.

– Quer ver mais um show? – Mayara perguntou enquanto sentia o coração pulsar forte n peito.

– Claro! – desde a hora que elas se sentaram para descansar até aquele momento, o número de pessoas na rua aumentou consideravelmente, o que dificultou um pouco para se enfiarem no meio do público enquanto assistiam a outro show. E então Mayara envolveu a cintura de Letícia com os braços, para surpresa da outra moça.

***

Joaquim estava com o notebook no colo, olhando possíveis artes para tatuar. Queria algo pequeno, num tamanho que cobrisse apenas aquela marcação repulsiva no seu quadril, mas não conseguia se decidir. Ouviu então a porta do banheiro se abrir e viu Francisco entrar no quarto, para em seguida entrar sob as cobertas na cama ao seu lado.

– Qual dessas eu faço? A tatuadora com quem eu marquei me disse que eu podia levar uma arte de referência. – virou o notebook para o namorado que observou as várias versões da pesquisa do Google de “tatuagens de estrela”.

– Eu acho que é você quem tem de escolher, afinal, a tatuagem vai ser feita no seu corpo. Faz assim, escolhe algumas que você gostar e daí eu te dou a minha opinião com base nisso, tá bom? – recebeu um beijo leve de Joaquim em resposta e então viu o rapaz se animar e começar a abrir imagens em abas novas do navegador.

– Tá, eu gosto dessas cinco aqui. Agora, qual a sua favorita? – o namorado estava bem animado com a tatuagem e Francisco percebeu que isso estava ligado diretamente a fazer aquela última lembrança desagradável do ex de Joaquim desaparecer.

– Estas duas aqui são bem legais, porque são todas preenchidas, então esconderia bem a... Você sabe. – não se sentia muito confortável em mencionar aquela cicatriz, até porque quando eles começaram a namorar e eles transaram pela primeira vez, Joaquim fez de tudo para não deixá-lo ver aquela marca.

– Obrigado por me apoiar. – ouvir aquilo do namorado lhe causava sentimentos mistos, ao mesmo tempo em que ficava comovido, Francisco também se sentia meio triste, porque apesar de estarem juntos há alguns anos, o loiro ainda tinha comportamentos reativos da época em que ainda namorava o ex, Marco.

Francisco nunca tinha visto o tal cara pessoalmente, mas foi apresentado ao tipo por fotos que Joaquim descartou assim que o relacionamento deles ficou mais sério. Ouviu as histórias e sabia o quanto o namorado sofreu na mão do outro e claro, antes disso, na mão do pai homofóbico.

E pensar que até o começo do ano Joaquim ainda sentia ciúmes dele com o ex, que ia se casar dali alguns meses e até o convidou para ser padrinho, mas Francisco ainda não tinha decidido se aceitaria. Queria conversar com o namorado antes. Os ciúmes do loiro era tão irracional, mas, ao mesmo tempo, compreensível, afinal ele tinha medo de ser trocado.

– Finalmente eu vou me livrar de vez da memória do Marco e deixar pra trás esse capitulo horrível da minha vida. – viu o loiro desligar o notebook e colocar o aparelho na mesinha de cabeceira.

– Será que você podia só... Me abraçar hoje? Prometo que depois eu te compenso sobre... – teve a frase cortada por um beijo apaixonado e sentiu a mão firme de Francisco acariciando seus cabelos, para em seguida, após partir o contato, sussurrar em seu ouvido.

– Você não precisa me compensar por nada. Eu já te falei antes, mas vou repetir quantas vezes você precisar ouvir: quando fizermos amor, tem de ser bom pra nós dois; eu não quero que você pense que tem alguma obrigação comigo. E eu vou te abraçar até  você dormir, quando você quiser. Vem cá. – sentiu os braços firmes do namorado envolverem seu corpo e um beijo ser depositado no topo da sua cabeça.

Joaquim suspirou um misto de alivio e felicidade e com o rosto próximo ao tórax morno do namorado, adormeceu. Ainda não conseguia acreditar que o outro o amava e respeitava como igual.

***

Já passava das duas da manhã quando Letícia e Mayara resolveram ir embora. Ambas estavam suadas e exaustas, mas felizes. Tinham comido bobagens numa barraquinha próxima, bebido mais água, voltado pro show, trocado mais alguns beijos e então Mayara disse que precisava voltar.

– Desculpa cortar a diversão assim, mas amanhã eu tenho de tomar conta do Paulo e não queria dormir muito tarde. – estavam entrando no estacionamento e Letícia entregava o ticket ao responsável.

– Tudo bem, a gente se divertiu bastante, foi ótimo! – entraram no carro e durante o trajeto, Mayara cochilou com a cabeça encostada no vidro.

– May... A gente chegou... – cutucou a moça com a ponta do dedo, em seguida tentou balançá-la de leve e finalmente conseguiu acordá-la. Viu a moça olhar na sua direção e sorrir, enquanto esfregava os olhos com as mãos.

– Obrigada por ter me convidado, eu adorei sair com você e... – viu Mayara se aproximar e sentiu pela segunda vez naquela noite a maciez suave dos lábios dela contra os seus e correspondeu ao gesto.

– Letícia, eu estive pensando... O que você acha de... A gente levar esse relacionamento para um nível acima? – Mayara pedia mentalmente para que a outra não lhe pedisse para explicar, pois ela se sentiria muito deslocada de fazer isso, mas, não precisou. Sentiu o carinho ser feito em seus cabelos que começava a escapar da trança e ouviu em resposta.

– Seria incrível. Se for o que você realmente quer fazer. – sorriu ao ouvir a resposta da outra moça e após dar um beijo suave na bochecha dela, desceu do carro, mas não sem antes dizer que podiam ir combinando pelo whats.

– Claro! Durma bem e diga pra suas mães que eu pedi desculpas por te trazer pra casa tão tarde. – Mayara riu e em seguida entrou em casa. Letícia ficou mais alguns segundos ali, digerindo a proposta que a outra moça fez a ela.

Continua... 

 

Notas do capítulo:

(Se você está lendo este capítulo muito tempo após a publicação, apenas ignore o começo desta nota).

Primeiro, eu quero pedir desculpas por demorar mais de um mês para atualizar essa história. Entre doenças físicas, crises depressivas e claro, a falta de ânimo, eu acabei me atrapalhando e não sabia como retomar a história. Para falar a verdade, não sei se consegui nesse capítulo que você acabou de ler (deixe um comentário pra eu saber que não perdi o ritmo!).

Enfim, desculpa a demora, prometo que vou tentar retomar o ritmo de antes.

Agora sobre o capítulo!

Tivemos um pouco de tudo! Principalmente Letícia e Mayara, como eu prometi que teríamos. E também um pouquinho de Diego e Marcelo e um pouco mais de Francisco e Joaquim.

A Mayara, como eu já falei antes é demissexual, ou seja, ela demora um pouco mais para desenvolver laços afetivos com outra pessoa e então se sentir sexualmente atraída. Eu não sei se seis meses de convivência é o bastante, afinal pelo que conversei com algumas pessoas Demi, o tempo para desenvolver atração sexual varia entre cada pessoa demissexual, mas acredito que, levando em conta tudo que as duas passaram juntas, incluindo os passeios com as crianças e o ocorrido com a Joana, uma das mães da Mayara, tudo isso acrescenta no desenvolvimento emocional.

Talvez eu fale mais do ex-namorado do Francisco, que vai casar no futuro e claro, ainda teremos a tatuagem do Joaquim e várias outras coisas acontecendo. Aguardem os próximos capítulos.

Enfim é isso, obrigada por ler e por favor, deixe um comentário, eles são muito importantes para eu saber que o que estou escrevendo vale a pena.

Até o próximo capítulo!

Perséfone Tenou.   

 

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